20/06/20

O Homem-Mulher - Sérgio Sant'Anna

A lot of men will do a lot to get laid. But that doesn't necessarily mean they play at love. It seems far more likely that love plays with them.

Clive James

António Lobo Antunes diz, num tom que denota mais gáudio que pesar, que os escritores portugueses fodem pouco. Ele deve saber do que está a falar. Eu digo, num tom que denota mais pesar que gáudio, que quero ser escritor e, ai de mim, nasci em Portugal. 

Não sei se os escritores portugueses fodem muito ou pouco, mas a verdade é que há poucas cenas de sexo memoráveis na literatura portuguesa. Carlos da Maia e Maria Eduarda em Os Maias protagonizam a cena mais interessante, mas a performance de Carlos é muito prejudicada pelo facto de saber que Maria Eduarda é sua irmã. O clímax dramático é o anticlímax sexual e o leitor consciencioso fica com um sabor a "agora que isto estava a ficar bom" na boca.

No Brasil, usando a aritmética de Lobo Antunes, os escritores devem foder muito. O português do Brasil também se presta mais à sensualidade, é verdade, mas a linguagem existe para descrever o mundo e, se o mundo dos escritores portugueses dispensa essa linguagem sexual, talvez o Lobo Antunes esteja certo. 

O Homem-Mulher dispensa a linguagem sexual em duas ou três páginas. As fodas, quando não acontecem, são imaginadas e sonhadas com o frenesim natural num macho da espécie. Patrice O'Neal pergunta, em Elephant in the Room, «Would you risk everything for a girl passed out behind a dumpster?», e a resposta é mais dificil do que parece. Isto talvez pareça um pouco vulgar, mas é uma visione amorosa cheia de ternura:
E ainda hoje, quando ouço os cânticos sagrados, é dela que me lembro, a minha garota, e, embora não lhe dê nem mesmo um nome, é a ela que amo.
Os homens, neste livro, apaixonam-se pela ideia de uma Mulher; a paixão e a ideia mantêm-se, só mudam as mulheres. Se isto não é ser romântico, não sei que vos diga.

Sem comentários:

Enviar um comentário