28/09/20

Os Conselhos da Noite - José Oliveira

 Perchi' I' no spero di tornar giammai

Guido Cavalcanti


No poema Glosa a Guido Cavalcanti, Jorge de Sena descreve o seu exílio, somando distâncias imensuráveis: 


Porque não espero de jamais voltar

à terra em que nasci; porque não espero,

ainda que volte, de encontrá-la pronta

a conhecer-me como agora sei

 

que a conheço…


Peregrinatio ad loca infecta não seria um mau título para este filme. José Oliveira parece querer mostrar a Braga idolátrica, mas também a menos conhecida Braga profana. 

Roberto, uma personagem bukowskiana, volta a casa e observa a cidade com um conhecimento antigo (consciência da história da cidade e as suas memórias pessoais) que o afasta do moderno. O resultado é uma série de vinhetas com referências edificantes ao Mosteiro de Tibães e à Cairense, uma famosa casa de putas; algumas cenas com música ao vivo à Kaurismäki; diálogo castiço; algumas cenas contemplativas com motivos religiosos e rememorativos; e um enredo geral que é menor e menos interessante que as partes já referidas.

Gostei muito de ver Braga num filme, por razões inteiramente pessoais; e  parece-me que José Oliveira precisava de ver Braga num filme, por razões inteiramente pessoais. O filme acaba com as folhas, que Roberto usou para escrever sobre a sua peregrinação a Braga, a arder, prefigurando um futuro livre das ideias que o atormentavam. Quero ver o próximo filme.

Sem comentários:

Enviar um comentário